«E toda a terra, cheia de admiração, seguia a besta».
(Apoc.13, 3)
Cada vez mais os homens estão mergulhados numa profunda
perplexidade. Eles olham para o mundo que os cerca, entram dentro dele,
querendo fazer como toda a gente, são membros de uma tal tribo global, mas de
vez em quando, um deles exagera no uso das "liberdades", e então
causa um certo susto nos outros.
Os assassinatos cometidos por adolescentes, nos Estados
Unidos, são um exemplo. Já passou o tempo em que o sinal da modernidade era os
filhos enfrentarem os pais. Agora eles metralham.
Tenho ouvido falar de reuniões em escolas, onde os directores
suplicam aos pais que voltem a educar os seus filhos, sabendo dizer não,
sabendo estabelecer limites aos filhos. Vai ver até que algum mais afoito diz,
sem querer, que é preciso dar umas palmadas...
Alguns directores chegam a citar os anos 60 como sendo o
início de tudo...(vocês talvez já tenham esquecido, que o mundo enlouqueceu na
década de 60, realizando uma destruição das últimas barreiras contra a
barbárie: é o advento dos hippies, do sexo livre, dos filhos gozando os seus
pais, das drogas, etc.)
Isto deixa-nos com certa nostalgia na alma. Verdadeiramente
eles estão desnorteados. Assustados com o que lêem nos jornais, com o que vêem
em casa; procuram explicações, mas não as encontram. Por quê?
A resposta é simples: perderam o rumo, perderam o norte, não
têm um critério de vida civilizacional.
Mas são eles mesmos os próprios culpados. Por terem achado
tudo muito lindo, ao deitar fora dois mil anos de civilização católica.
Finalmente, livres de todos os tabus, saíram pelo mundo, alegres e felizes,
respirando um ar puro, cada vez mais puro pela preservação do planeta, e cada
vez mais fétido, pela decomposição das almas.
Qual o critério que eles perderam? A razão e a Fé. A casa e a
Igreja. Esta é a luz que lhes falta.
Vamos supor que todos os católicos saibam ou acreditam, que o
homem é composto de corpo e alma. Que a alma foi criada por Deus no momento da
concepção, exclusivamente para aquele corpo. Temos então uma sementinha já toda
ela programada no código genético para ser o Paulo ou a Ana, daqui a nove
meses. Deus cria uma alma espiritual, capaz de O conhecer e amar, e sopra este
espírito naquela sementinha corporal. Não é difícil entender que é a alma que
vai dar vida ao corpo. No caso do homem, a vida será espiritual, pois a alma é
capaz de conhecimento e de amor. O animal terá uma vida apenas capaz de
movimento de sensibilidade, mas não de inteligência. A planta terá ainda menos
capacidades, insensível que ela é. O que diferencia o homem dos outros seres vivos
é o seu espírito inteligente.
E é evidente que a alma imortal tem uma finalidade, que só
pode ser adequada à sua natureza, ou seja, só pode ser espiritual. A finalidade
é a de usar a capacidade intelectual e a capacidade de amar no máximo da sua
realização, que é conhecer e amar o próprio Criador, Deus Nosso Senhor.
Todas as instituições humanas procuram dar ao homem alguma
ajuda, alguma facilidade para a vida natural. O Estado protege o cidadão (pelo
menos deveria proteger e não assaltar), a Escola ensina uma profissão (deveria
ser o complemento da educação familiar), o emprego traz o sustento, etc.
Mas era preciso uma instituição que se ocupasse da alma, que
a ajudasse na sua finalidade última, e que, ao mesmo tempo, tivesse autoridade
para isso. Foi por isso que Nosso Senhor Jesus Cristo fundou a Igreja,
deixando-a na terra com a autoridade divina para ajudar os homens a alcançar o
seu fim último, que é a vida eterna. E os meios para alcançar este fim são de
obrigação para os homens. Deus fez-nos capazes de conhece-Lo e de amá-Lo, mas
não admite que nós desprezemos essa capacidade. A Sua Lei Santa, revelada
através dos profetas e, sobretudo, pelo seu Filho Encarnado, é a luz da sua
Vida íntima lançada sobre a vida dos homens.
Houve quase dois mil anos para os homens viverem assim. Foi a
civilização cristã, que sobreviveu a tantas dificuldades, a guerras, às faltas
dos seus filhos gananciosos. Mas essa civilização acabou.
Nos últimos séculos, já as nações rechaçavam a autoridade da
Igreja, num mundo cada vez mais louco. Ela porém, guardava a sua dignidade de
voz suprema dos desígnios dos homens, devido ao seu fim sobrenatural, de salvar
os homens pelo Sangue Preciosíssimo de Nosso Senhor. Com o Vaticano II, as
autoridades da Igreja renunciam a este papel. E isso duplamente: primeiro
aceitando a ideia corrente de que ela não seria a detentora da verdade, a única
fundada por Cristo; em seguida, perdendo a visão sobrenatural da sua missão,
mergulhando em preocupações sociais e políticas, voltadas para a vida natural
dos homens.
Está derrubada a última barreira que ainda segurava os
homens. Maravilhados com tanta liberdade, sairão por aí inventando mil
novidades, oficializando mil pecados, divertindo-se a valer. Não querem saber
de proibições, de castigos, de repressões, como dizem. Tudo pode, tudo é
permitido. Chega a ser difícil lembrar todos os aspectos de tamanha catástrofe
para a humanidade. Mas a técnica vai muito bem, obrigado. E em nome dos
satélites, todos os males e pecados são perdoados.
Enquanto este mundo vai ganhando espaço, vai se difundindo, o
tempo vai passando. Mais de uma geração já passou. A memória de uma vida sob a
luz divina da Igreja já é coisa de museu. Os homens de hoje já não têm noção do
que seja isso. Os dogmas religiosos foram substituídos pelas ideologias
dominantes; os dias santos de guarda substituídos por feriados pagãos, a moral
católica, retrato da vida divina, foi ridicularizada ao extremo, dando lugar ao
moralismo ferrenho dos jornalistas.
Parece que as coisas mudaram e todos se comecem a preocupar
com isso. Aparentemente é uma boa tendência, mas quando analisada mais de
perto, percebemos que ela esconde uma fraude: o que está em jogo é o prejuízo
psicológico das crianças, mergulhadas precocemente num ambiente sensual e sexual,
num excesso de liberdades que as levam a distúrbios psíquicos e sociais. Eles
descobriram, um pouco tarde, que o sexo precoce faz mal à saúde e que
liberdades em excesso geram injustiças. E é só!
Vejam bem, para um casal católico, esta preocupação está
aquém da realidade. Não é esta a nossa principal preocupação. Antes de tudo,
acima de tudo, com todas as forças da nossa alma, devemos educar os filhos para
agradar a Deus! E isto significa agir sempre, em tudo, segundo os dez
mandamentos: honrar pai e mãe, que nos ensina a respeitar o princípio de
autoridade; não pecar contra a castidade, que nos ensina que o sexo só pode ser
realizado dentro das finalidades santas do casamento católico! E os outros...
Ou seja, voltamos ao que dizíamos: os homens abandonaram a
submissão à autoridade divina da Igreja, e com isso perderam o rumo da vida.
Perdendo o rumo, estão a dar voltas como baratas tontas. Cansados, tontos,
abandonados às paixões que são fonte de gozo mas também de dor, ficam
mergulhados nesta perplexidade burra e medíocre. Não querem ler nada que lhes
exija raciocínio e oração: recusam a luz dos santos doutores e a fé que liberta
a inteligência.
E eu pergunto: esses alertas equivocados surtirão algum
efeito? A minha convicção é que nada mudará. Porque a liberdade desenfreada dos
jovens de hoje envolve muito, mas muito dinheiro: da Xuxa, com as suas roupas e
bibelôs, passando pelo Cartoon, canal de TV cabo, que metralha na consciência
das crianças "desenhos, e mais desenhos, e ainda desenhos", cada um
mais estúpido que o outro, quando não incentivadores a crueldades, as
discotecas e bailes onde tudo acontece.
Quando Deus não é a regra, o parâmetro, a medida do reto
agir, o homem passa a ser o seu próprio Deus. É assim que nos querem sujeitar a
estes moralistas do mundo moderno, os jornais e os políticos. Eles ditam as
regras que nós devemos cumprir, enquanto enchem os bolsos…
Qual é, então, o nosso combate?
Silenciar, no fundo do nosso coração, os ruídos estranhos
desta guerra louca, fugir dos desejos que nos impelem a querer ser como eles:
ricos, livres, poderosos, gozadores da vida.
Praticar as virtudes cristãs, amar a pobreza, usar dos bens
que Deus nos permite ter com generosidade e desprendimento. Amar a castidade,
ensinar os filhos a resistir e a lutar contra tendências do corpo que são,
exactamente, tentações do diabo, mesmo se correspondem à fisiologia da idade.
Ler para alimentar a razão, rezar para alimentar a fé. Descobrir no Santo
Sacrifício do Altar o refúgio necessário onde, cada domingo, vamos ganhar
forças para lutar todos os dias.
Acordem!
É preciso sacudir o peso que lhes foi colocado sobre a alma,
a vergonha de se achar diferente porque os outros não vão à missa no domingo,
andam nus pelas ruas ou traem sem escrúpulos as promessas feitas diante do
altar.
Experimentem a grande liberdade de não serem iguais a eles,
de não serem escravos da moda, ou dos pecados do mundo. O que se resume nisto:
tenham personalidade, sejam o que de facto são: homens, inteligentes e capazes
de amar o Bem último das suas almas, o Único necessário, Aquele que, só Ele,
pode trazer repouso para as vossas almas cansadas. Católicos, cumpridores das
promessas do vosso baptismo, e que, mais do que tudo, só querem amar ao Senhor
nosso Deus, Três vezes santo, que derramou o seu próprio Sangue para nos
conquistar um lugar no Céu.
E enquanto eles continuam a sorrir, perplexos e fracos,
diante das loucuras que vêem todos os dias na TV, tenhamos plena consciência de
que os tempos são maus, e que é preciso estar vigiando, para que não suceda que,
vindo o Senhor no meio da noite, nos encontre sonolentos e adormecidos.
- Dom Lourenço Fleichman OSB