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O que pode (e deve) fazer a psicologia por um católico que necessita de ajuda
- 06-01-2022
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Entrevista com Gladys Sweeney, do «Institute for the Psychological Sciences»
Uma psicologia enraizada na visão católica da
pessoa humana está em coerência tanto com a ciência como com Deus, afirma nesta
entrevista concedida a Gladys Sweeney.
No seu campo, este centro universitário americano
orienta-se a estender pontes entre ciência e fé.
- Que soluções a senhora proporia aos católicos que sofrem depressão ou
outros transtornos mentais?
- Gladys Sweeney: Frequentemente, a depressão, ou outras formas de transtorno
mental, constitui um obstáculo ao livre arbítrio. Um tratamento psicológico
eficaz é muito útil, porque busca essencialmente libertar a pessoa não só para
que veja o «bem de forma mais realista, mas também para que seja capaz de
eleger o «bem».
Tradicionalmente, houve uma desconfiança mútua entre as ciências psicológicas e
os católicos. A psicologia tende a ver a fé como comportamento supersticioso,
enquanto que as pessoas de fé tendem a ver a psicologia como uma ciência
desnecessária para elas. Uma fé suficiente deveria bastar para se ocupar de
todos os problemas, quaisquer que sejam.
Nenhuma das duas posturas reflecte a verdade. Uma psicologia enraizada na
compreensão católica da pessoa humana não é só verdadeira para a ciência, mas
verdadeira com respeito a Deus. As ciências psicológicas têm muito a oferecer a
pessoas cujo livre arbítrio está afectado.
Tomemos por exemplo o caso de uma pessoa excessivamente escrupulosa. Tal pessoa
poderia de fato sofrer «neurose obssessivo-compulsiva». Esta desordem
psicológica pode chegar a ser tão grave, se não tratada adequadamente, que
impede a pessoa de funcionar normalmente.
Pessoas católicas, boas e fiéis, poderiam de fato deixar a confissão para não
sentir que fizeram uma confissão inválida por terem esquecido de confessar
«todos» os pecados. Poderiam deixar de comungar por medo de estar recebendo
indignamente o Senhor. Esta desordem é facilmente diagnosticada e tratada.
As ciências psicológicas estão ao serviço da Igreja. Ajudando esta pessoa a
recuperar um funcionamento normal, estará liberta da neurose. Mas a liberdade
não é só uma «liberdade desde», é também uma «liberdade para»: uma liberdade
para chegar a ser cristãos melhores e para poder-se beneficiar de uma vida
sacramental.
Proposta a questão em termos adequados, então não existe nenhum conflito entre
uma psicologia fundada em uma sã antropologia e os ensinamentos da Igreja. O
desafio é encontrar psicólogos adequadamente formados nesta perspectiva, que
respeitem os valores religiosos de seus pacientes sem miná-los de nenhum modo.
- Quais são os erros mais comuns hoje no tratamento da depressão?
- Gladys Sweeney: Um dos maiores erros no tratamento da depressão é a noção de
que a depressão se alivia «unicamente» através de medicação.
Ainda que é certo que o uso de antidepressivos ofereceu um tremendo alívio a
pacientes que padecem este transtorno, recorrer exclusivamente ao tratamento
farmacológico, excluindo formas mais tradicionais de psicoterapia, não é o
tratamento melhor.
Um dos tratamentos mais eficazes contra a depressão é o que os psicólogos
chamam «reestruturação cognitiva». Esta modalidade de tratamento tende a
reordenar as emoções de acordo com a razão.
Com frequência, nos casos de depressão, a sensação de desespero e impotência
toma controle de toda a pessoa, e o paciente não é capaz de ver a realidade
objectivamente. É como se visse o mundo através de um cristal escuro. Uma
pessoa deprimida pode «interpretar» um acontecimento neutro como algo negativo
ou pessoalmente ofensivo, quando na realidade não é assim.
O tratamento consiste em ajudar a pessoa deprimida a reestruturar seu
pensamento, orientando-a a reestruturar seus esquemas distorcidos e negativos.
É treinada a ordenar as emoções de acordo com a razão e a ver as situações de
forma mais objectiva. Demonstrou-se extremamente eficaz para ajudar as pessoas
com este diagnóstico.
É importante observar que às vezes as pessoas deprimidas inicialmente não
respondem bem a esta terapia. Sobretudo quando a depressão é severa.
Nestes casos, o melhor tratamento é uma combinação de medicação e terapia
cognitiva. Em qualquer caso, a medicação só raramente é boa solução em longo
prazo para o problema.
- De que forma uma vida em Cristo --participando nos sacramentos, tendo
oração e procurando direcção espiritual-- ajuda a curar as patologias mentais?
- Gladys Sweeney: A participação na vida sacramental, na oração e na direcção
espiritual constitui meios para receber a graça divina.
A espiritualidade cristã é viver em Cristo pela graça do Espírito Santo que nos
faz crescer na fé; significa ter uma esperança fundada na fé e sobretudo no
amor como plenitude da fé no caminho recto para a comunidade da Santíssima Trindade.
Como a graça aperfeiçoa a natureza, esta espiritualidade é totalmente coerente
com a saúde psicologia. Mas a saúde espiritual e a saúde psicológica não são
idênticas, nem sempre proporcionadas.
Uma pessoa que sofre neurose obsessivo-compulsiva, que não é capaz de confessar
e talvez nem sequer de comungar, necessita de tratamento a fim de poder se
valer dos meios com os quais se recebe a graça santificante. Em qualquer caso,
a saúde mental, como a saúde física, não é uma condição necessária para a santidade.
Uma pessoa que sofre ansiedade não necessita de ser tratada primeiro desta
desordem para desenvolver as virtudes do valor e da fortaleza ou crescer em sua
confiança em Deus. Certamente ajuda, mas não é uma condição sine qua non para o
crescimento nas virtudes humanas. As dificuldades que se encontram ao lutar com
condições psicológicas podem de fato servir para favorecer determinadas
virtudes, ou ser motivo de momentos de maior graça e de aprofundamento da vida
espiritual.
Portanto, a menos que os problemas psicológicos da pessoa dificultem sua
participação na vida sacramental, é de suma importância que a pessoa participe
activamente nela, ainda que esteja em terapia. É por isto que é tão importante
que o terapeuta se dê conta desta necessidade e alente a pessoa a realizá-la.
Os efeitos da acção da graça combinados com um são tratamento psicológico são
muito eficazes para conseguir a cura. Qualquer católico que sofra enfermidades
mentais deverá seguir recebendo os sacramentos com frequência e respeito, além
de manter uma vida de oração habitual e equilibrada.
Um bom director espiritual pode ser muito útil a esse respeito, proporcionando
guia no caminho do crescimento espiritual. Seja através da terapia ou da
espiritualidade, é sempre Cristo quem cura.
- Por que é importante que os católicos com problemas de saúde mental
recorram a terapeutas também católicos?
- Gladys Sweeney: Toda teoria psicológica contém determinados postulados
relativos à natureza e ao destino da pessoa humana. Há teorias seculares por
natureza e às vezes abertamente anti-religiosas. Às vezes negam a existência da
liberdade humana, das verdades morais, e portanto a realidade do pecado.
É pelo que o Santo padre diz: «Dilui-se este sentido do pecado na sociedade
contemporânea também por causa dos equívocos nos que se cai ao aceitar certos
resultados da ciência humana. Assim, em base a determinadas afirmações da
psicologia, a preocupação por não culpar ou por não pôr freios à liberdade leva
a não conhecer jamais uma falta».
Assim que os católicos devem estar muito atentos ao receber a assistência
psicológica ou ao permitir às modas psicológicas influir na própria vida.
Também os psicólogos em geral tendem a ver a religião de forma mais negativa,
coisa que cria ulteriores dificuldades aos católicos. Durante uma psicoterapia
é possível que o terapeuta influa no paciente de maneiras subtis que lentamente
minem suas convicções religiosas.
Com um bom terapeuta católico, em qualquer caso, a fé e a prática religiosa dos
pacientes seria alentada e até poderiam falar de questões religiosas durante as
sessões. Tal terapia trabalha desde uma compreensão autêntica da pessoa humana
baseada nos ensinamentos da Igreja e reforçada por elementos psicológicos sãos.
Este tipo de aproximação é absolutamente essencial para qualquer católico que
busque ajuda por um problema de saúde mental.
- Que recursos a Igreja oferece aos membros de seu rebanho que tenham a ver
com questões de saúde mental?
- Gladys Sweeney: A Igreja nos oferece Cristo, que é a revelação do amor do Pai
e é a revelação do homem ao homem.
Cristo nos revela o sentido de nossa existência e a resposta ao anseio de nosso
coração. A Igreja, ao dar-nos Cristo, dá-nos o que mais desejamos e em última
instância o único capaz de satisfazer-nos.
Neste «vale de lágrimas» haverá inevitavelmente desilusões, tragédias e
sofrimentos, e todo o tempo a Igreja nos orienta mais além deste horizonte,
para o seio da trindade, onde Cristo está preparando uma morada para nós.
Cristo nos mostra, portanto, o sentido redentor do sofrimento. Através dos
sacramentos da Igreja, encontramos Cristo e nos renovamos e transformamos
continuamente, na medida em que cresce nossa união com Ele.
Em todo caso, a Igreja precisa ter em conta a específica função que a ciência
psicológica pode desempenhar, especialmente se está nas mãos de terapeutas bem
formados e equilibrados que compreendam o ensinamento da Igreja sobre a
liberdade e a dignidade humana.
A colaboração mútua da ciência humana e do trabalho pastoral é de uma
importância, e se se realiza em harmonia, pode levar almas a Cristo e promover
o estabelecimento do Reino de Deus nesta terra.