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É razoável crer?

É razoável crer?

 

Histórias importantes

 

Alfonso Aguiló no seu livro “É razoável crer?” conta histórias que nos ensinam grandes verdades.

 

1. Sobre o Relativismo

O relativismo significa que não podemos conhecer a verdade como tal é ou em sentido pleno: cada um tem a sua “verdade”. É um grande e perigoso engano:

“Conta Peter Kreeft que, um dia, ao dar uma das suas aulas de ética, um aluno lhe disse que a Moral era uma coisa relativa e que ele, como professor, não tinha o direito de “impor-lhe os seus valores”. “Bem – respondeu Kreeft, para iniciar um debate sobre a questão - vou aplicar à classe os seus valores e não os meus. Tu dizes que não há valores absolutos, e que os valores morais são subjectivos e relativos. Como acontece que as minhas ideias pessoais são um tanto singulares sob alguns aspectos, a partir deste momento vou aplicar esta: todas as alunas estão reprovadas”. O rapaz mostrou-se surpreendido e protestou dizendo que aquilo não era justo. Kreeft argumentou-lhe: “Que significa para ti ser justo? Porque, se a justiça é apenas o “meu” valor ou o “seu” valor, então não há nenhuma autoridade comum a nós dois. Eu não tenho o direito de impor o meu sentido de justiça, mas tu também não podes impor-me o teu…Portanto, se só existe um valor universal chamado justiça, que prevaleça sobre nós, tu podes invocá-lo para considerar injusto que eu reprove todas as alunas. Mas, se não há valores absolutos e objectivos fora de nós, tu só podes dizer que os teus valores subjectivos são diferentes dos meus, e nada mais. No entanto, tu não dizes que não gostas do que eu faço, mas que é injusto. Ou seja, quando desces à prática, acreditas sem a menor dúvida nos valores absolutos”…Os relativistas e os cépticos consideram que aceitar qualquer crença é servilismo, uma torpe escravidão que inibe a liberdade de pensamento e impede uma forma de pensar elevada e independente. No entanto – como dizia C. S. Lewis –, mesmo que um homem afirme não acreditar que haja bem e mal, vê-lo-emos contradizer-se imediatamente na vida prática. Por exemplo, uma pessoa pode não cumprir a palavra ou não respeitar o combinado, argumentando que isso não tem importância e que cada qual deve organizar a sua vida sem pensar em teorias. Mas o mais provável é que não tarde muito em dizer, referindo-se a outra pessoa, que é indigno que essa pessoa lhe tenha faltado à palavra…”.

Por não ter um ponto de referência claro a respeito da verdade, o relativismo leva à confusão global entre o bem e o mal. Se se analisam com um pouco de detalhe as suas argumentações, é fácil observar – como explica Peter Kreeft – que quase todas costumam refutar-se a si próprias:

- “A verdade não é universal” (excepto esta verdade que acabas de afirmar?).              

- “Ninguém pode conhecer a verdade” (a não ser tu, segundo parece).              

- “A verdade é incerta” (então também é incerto o que tu dizes!).               

- “Todas as generalizações são falsas” (esta também?).               

- “Tu não podes ser dogmático” (com esta mesma afirmação, mostras que és bastante dogmático).               

- Não me imponhas a tua verdade” (o que significa que neste momento estás a impor-me as tuas verdades).              

 - “Não há absolutos” (absolutamente…?).               

- “A verdade é apenas uma opinião” (a tua opinião, pelo que vejo).

E assim por diante.

2. A graça de Deus e a liberdade do homem

Eis outra historieta significativa (pp. 55s):“Um indivíduo desalinhado e sujo pôs-se de pé, no meio de um buliçoso grupo de pessoas que escutavam um pregador no Hyde Park de Londres. Dirigiu-se ao orador e com voz potente fez-lhe uma pergunta que era antes um grito de indignação: “O senhor diz que Deus veio ao mundo há dois mil anos… Como é possível então que o mundo continue cheio de ladrões, adúlteros e assassinos?”.

Fez-se um silêncio muito grande. Todos os que estavam presentes acharam que era uma objecção irretorquível. Mas o pregador olhou-o serenamente e respondeu: “Tem toda a razão. Mas a água também existe há milhões de anos, e, no entanto…, repare como você está sujo!”

Assim como aquele homem podia servir-se ou não das benéficas possibilidades higiénicas da água, nós, os homens, temos a possibilidade de usar bem ou mal a nossa liberdade. Mas quem é responsável por esta decisão somos nós, não Deus. Deus foi o primeiro a “apostar” no homem, o primeiro a querer “correr o risco” da nossa liberdade, e isso a ponto de permitir que o homem pudesse empregar a liberdade precisamente para se opôr ao seu Criador”.

É de notar que, mesmo antes de Cristo, Deus sempre esteve presente ao homem, chamando-o para o consórcio da sua vida. E isto de duas maneiras:1) mediante a consciência moral que existe no íntimo de todo o ser humano e clama: “Pratica o bem e evita o mal”. Tal é a chamada “lei natural”;2) mediante o testemunho das criaturas que cercam o homem e atestam a sabedoria do Criador “Não há relógio sem relojoeiro”.

3.Lei natural (de Deus) e lei dos homens

Retrocedamos ao século V a.C.

“Sófocles conta numa das suas tragédias a história de Polinice, um jovem que morre na rebelião contra Creonte, o tirano de Tebas. Para dar uma lição pública. Creonte ordena que se abandone o cadáver do rebelde no campo, a fim de que seja devorado pelas feras. E, se alguém se atrever a dar-lhe sepultura, morrerá.

Mas Antígona, a irmã de Polinice, desafia a ordem do tirano e enterra o irmão. É denunciada e Creonte acusa-a de desprezar a lei. Ela responde corajosamente: “Não acreditava que os teus decretos tivessem tanta força que pudessem passar por cima das leis não escritas, imutáveis, dos deuses; dessas leis que vigoram não desde ontem, mas desde sempre, e ninguém sabe quando apareceram”.

O diálogo continua, faiscante, e é um bom reflexo de como a sociedade grega de há vinte séculos reconhecia a existência de leis naturais imutáveis. Porque, se o fundamento da Moral fosse a vontade dos povos, ou ainda as decisões dos seus chefes ou as sentenças dos seus juízes, então tudo o que se aprovasse legalmente se converteria num bem, mesmo que autorizasse a mentir, roubar ou matar.

A lei moral deve surgir de alguma coisa impressa na natureza humana, a que chamamos lei natural. É uma lei que obriga todos os homens e quem nem sempre coincide com os gostos do momento de cada governante, de cada sociedade, de cada pessoa” (p. 118).

O texto de Sófocles atesta a prática da objecção de consciência já em época anterior a Cristo. O súbdito não pode ser obrigado a cumprir uma lei que fira os justos ditames de sua consciência. (N.d.R.).

4. “A Igreja quer impor à sociedade civil os seus valores religiosos”

As palavras acima retornam com frequência quando se considera a firme atitude negativa da Igreja frente ao divórcio, ao aborto, à manipulação de embriões, casamentos de homossexuais, eutanásia… Muitos alegam que a Igreja deveria restringir as suas rejeições ao âmbito dos seus fiéis, sem se importar com os pronunciamentos da Lei civil.

1) “A Igreja não pretende impor a ninguém uma religião ou umas crenças. O Concílio Vaticano II recordou com clareza o esmero que a Igreja e os católicos devem respeitar a liberdade religiosa de todos os homens. A Igreja Católica exprime com liberdade a sua mensagem, dirigida a todos os fiéis católicos e a todos os homens de boa vontade que queiram escutá-la. Não seria sensato dizer que, pelo simples facto de falar, pretende impor os seus valores à sociedade civil. Quando a Igreja fala, faz uso da liberdade de expressão, à qual, felizmente, todos temos direito.

Uma das missões da Igreja Católica é despertar a sensibilidade do homem para a verdade, para o sentido de Deus e a consciência moral. A Igreja procura infundir coragem e ânimo para que se viva e se actue com coerência, de acordo com convicções que possam constituir um fundamento sólido” (p. 149).

2) Quando a Igreja reprova certos procedimentos da ordem civil (divórcio, aborto, manipulação de embriões…), ela não o faz unicamente em nome do Evangelho, mas também em nome da lei natural, à qual todo o ser humano está sujeito, mesmo que não tenha fé. O respeito à lei natural é condição indispensável para que haja ordem na sociedade e esta não fique entregue ao alvitre pessoal ou partidário do(s) governante(s). O legislador não é “dono da Ética” nem é a fonte da moralidade; ele está sujeito à lei básica que é a lei natural; cabe-lhe explicitar essa lei natural e nunca a contrariar.

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