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Jovens com Valor

Salvos do álcool

Alcoolismo, superação, ajuda

Salvos do álcool

As reuniões abertas dos AA (Alcoólicos Anónimos), em que «não se fazem discursos insuportáveis», mas em que cada um dá a sua própria experiência pessoal e a confronta com a dos outros, levam uns e outros a trocar sugestões para deixarem de beber e para enfrentarem todo o tipo de problemas.
O João é um rapaz alto, moreno, de olhos muito expressivos. Não consegue explicar nada sem mexer continuamente as mãos. Este facto, associado à sua maneira de vestir, confere-lhe um ar solto e alegre. Cármen também é morena; os seus cabelos, atados com uma fita grossa, caem em todas as direcções, como cascata indisciplinada.
— João, porque te tornaste alcoólico?
— Julgo que me tornei alcoólico — fique bem claro que já não sou — porque não reflectia. Comecei por uma imperial, depois por uma caneca... No primeiro ano do secundário apanhei a primeira bebedeira. Tínhamos saído com umas raparigas e, depois de termos passado a tarde com elas, reunimo-nos só o nosso grupo de amigos e começámos a beber cerveja atrás de cerveja. Acabámos todos bêbados. No dia seguinte fiz catorze anos.
— O meu caso foi diferente — diz a Cármen. — Até aos dezoito anos, eu tinha uma imagem de filha-modelo e vivia em conformidade com ela. Cheguei mesmo a ganhar uma bolsa para estudar na Universidade. Quando comecei o curso superior entrou em mim uma espécie de rebelião e comecei a beber nas festas e nos fins-de-semana. Escolheram-me para delegada de turma, mas não correspondia como tal nem estudava absolutamente nada. O álcool atraía-me cada vez mais, porque me fazia esquecer os problemas.
— O álcool domina-nos rapidamente — garante o João — e tudo é pretexto para beber. Eu obtive documentos falsos para demonstrar que era mais velho e assim consegui ter automóvel e tudo... não imaginas — acrescenta com um gesto expressivo. — Comecei a misturar a bebida com a condução e podes imaginar os resultados...
No meu grupo de amigos, medíamos o êxito escolar pelo número de festas a que assistíamos, os casos que tínhamos com raparigas e as vezes que nos embebedávamos. Nos estudos, íamos passando como podíamos. O nosso maior esforço consistia tentar «passar bem», como nós dizíamos.
— Julgo que isso de passar bem — intervém a Cármen — deu cabo de muitos de nós. Os meus pais, ao verem que eu não me concentrava nos estudos, mandaram-me passar o Verão fora, para que assim deixasse alguns grupos de amigos e assentasse a cabeça. Mas isso ainda foi pior, porque na aldeia em que estive, como não tinha diversões, aborrecia-me imenso, passando a ser frequentadora aficionada do bar. Passei assim de beber só aos fins-de-semana a beber todos os dias. O álcool dominou-me por completo. Quando bebia antes das aulas, sentia-me a mais, e tinha vergonha de assistir a elas; apesar disso, depois de viver algum tempo com estes sentimentos, comecei a beber para poder ir às aulas, para aceitar encontrar-me com rapazes e para conseguir ir às festas.
Graças a um amigo — continua Cármen — fui assistir a uma reunião de AA, mas pensei que aquilo não ligava com os meus vinte anos, pois ainda me sentia muito jovem; por outro lado, julgava que sem álcool já não poderia divertir-me, pelo que não voltei lá. Contudo, as tensões, a solidão, o sentimento de culpa, os remorsos e a tristeza iam aumentando à medida que crescia a minha dependência do álcool.
— E uma sensação terrível — comenta João. — O meu estado chegou a um ponto tão desastroso, que os meus pais tiveram de me internar numa clínica e, quando tive alta, passados dois meses, recomecei a beber. Finalmente, chegou o dia em que me convenci de que o álcool era mais forte do que eu, e que precisava de ajuda; foj assim que assisti a uma reunião de AA. A partir de então, há já mais de dois anos, nunca mais bebi um único trago. O que mais me impressionou foi a compreensão demonstrada pelos membros desta associação; ali eu podia mostrar-me tal qual era. Os AA. devolveram-me à Universidade e, desde logo, o meu conceito de «passar bem» mudou completamente. Agora penso de outra maneira.
— A minha experiência é semelhante — reforça Cármen. — Como a minha tristeza e solidão ia aumentando, eu cada vez bebia mais para ficar atordoada e, além disso, levava as minhas amigas a beber cerveja atrás de cerveja, até que um dia percebi, horrorizada, que estava a perder a memória. Foi quando disse para comigo: “Nunca mais volto a beber; no entanto, como sabia que não tinha força de vontade para tanto, recorri de novo aos AA, e aqui estou, e aqui continuo. Agora sou uma rapariga muito diferente, que não quer esquecer essa experiência dolorosa. Passei muito mal. Gostaria de ajudar, sobretudo, os que começam a beber álcool, sem se preocuparem minimamente com o perigo que correm.

 

 

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