Mas aconteceu de uma raposa passar por baixo da árvore e quando viu o queijo, começou a pensar no modo de o roubar.
E foi assim que disse:
— Belo Corvo, há muito que ouço falar de vós, da vossa nobreza e da vossa galhardia. Embora eu vos tenha procurado por toda a parte, não consegui encontrar-vos antes.
Mas, agora que vos vejo, acredito que sedes muito superior a tudo quanto me diziam. E para que vejais que não procuro bajular-vos, não somente falarei dos vossos bons dons, mas também dos defeitos que vos atribuem.
Todos dizem que, sendo preta a cor da vossa plumagem, olhos, patas e garras, e sendo que o preto não é tão belo como as outras cores, o facto de ser assim preto vos torna muito feio.
Mas eles não percebem o erro, pois embora as vossas plumas sejam pretas, elas têm um tom azulado, como as do pavão, que é a mais bela das aves.
E posto que os olhos foram feitos para ver, enxerga-se melhor quando são pretos e por isso todos louvam os olhos da gazela, que os têm mais escuros que qualquer animal.
Além do mais, o vosso bico e as vossas garras são mais fortes que as de qualquer outra ave do vosso tamanho.
Também vos quero dizer que voais com tanta velocidade que podeis ir contra o vento, ainda quando é muito forte, coisa que muitas outras aves não podem fazer tão facilmente como vós.
E porque Deus me concedeu a dita de vos ver e de comprovar que sedes mais belo do que dizem, eu me sentiria muito ditosa ouvindo o vosso canto.
Embora a intenção da raposa fosse enganar o corvo, sempre disse verdades pela metade. Mas uma enganosa meia-verdade produz os piores males e os maiores prejuízos.
E quando o corvo sentindo-se tão bajulado pela raposa e achando que era verdade tudo o que dizia, supos que não estava sendo logrado mas que era sua amiga, não suspeitou que falava só para lhe tirar o queijo.
Ludibriado por palavras e afagos, o corvo abriu o bico para cantar e agradar à raposa. Quando isto fez, o queijo caiu por terra.
Pegou-o logo a raposa e fugiu com ele.
Assim o corvo ficou iludido pelas bajulações da sua falsa amiga, que o fez acreditar que era mais belo e mais perfeito do que realmente era.
sempre procura tirar-te alguns bens.