Parece que foi ontem o dia do casamento, mas os anos passaram
e já não há mais nenhum sentimento positivo. Olho para o meu cônjuge e não
sinto nada, apenas um desejo de ficar longe dele. “Não o admiro, ele é cheio de
defeitos! Não sinto nem mesmo atracção. Chego a não querer ter relações
sexuais, não quero ficar próximo dele. Acho que já não o amo!”
Essas expressões são bastante comuns no dia a dia de quem
atende ou escuta os casais. Entretanto, o que, na realidade, pode estar a
acontecer? O que significa esta expressão comum na fala dos casais: “eu já não
amo?”. O que pode fazer com que as pessoas sintam este esfriamento emocional e
esta distância do outro? Existe saída?
Quando o casal vivencia conflitos e tensões no dia a dia,
essas situações marcam-nos de alguma forma e, geralmente, de maneira negativa.
A partir desses conflitos diários, identificamos duas produções: os conceitos
negativos e a mágoa.
Não existe mais nenhum
sentimento positivo entre mim e o meu cônjuge
Os conceitos negativos sobre o cônjuge são formados no dia a
dia, diante das diversas situações como excesso de cobranças, volume e tom de
voz, palavras duras e grosseiras, agressividades, silêncios, falta de
colaboração, dificuldade de partilha financeira entre outras dificuldades do
relacionamento a dois. Tais situações, provavelmente, constroem uma visão negativa
sobre o outro, não permitem ver mais aqueles atributos e características positivas
que, um dia, os fizeram amarem-se e admirarem um ao outro. Então, por meio
dessas vivências desajustadas, podemos perceber que entra em cena um sentimento
muito pouco reconhecido, normalmente escondido por nós mesmos: a mágoa.
A mágoa é um sentimento que nos afecta, quando interpretamos
que alguém nos ofendeu, agrediu, foi injusto ou diminuiu o nosso valor,
provocando, como consequência, o afastamento progressivo dessa pessoa.
Portanto, o que nos leva a uma sensação de falta de amor é, na verdade, a
mudança de conceitos que, aos poucos, vamos introduzindo em nós diante dos
conflitos diários; e a mágoa que surge a partir das vivências negativas
advindas dos conflitos e tensões que o casal vive.
Há “estágios” da mágoa. Existe um estágio inicial no qual a
pessoa apresenta um sentimento negativo, mas ainda há admiração pelo cônjuge.
Posteriormente, a pessoa vivencia um período no qual a mágoa o leva a
sentimentos mais intensos de ira e a necessidade de um distanciamento cada vez
maior. Logo a seguir, o último estágio, no qual a pessoa não vê mais nada de
positivo no cônjuge, ela o vê como mau, como alguém impossível de conviver e,
mais ainda, inicia-se um processo de desejar o mal, falar mal dessa pessoa e
até a vingança.
Qual a saída?
É preciso buscar o remédio para a mágoa, que se chama perdão.
Ele é um acto de amor e misericórdia. Segundo Griffa e Moreno, no livro “As
chaves para a psicologia do desenvolvimento”, os estágios do desenvolvimento da
noção do perdão são as últimas aquisições no desenvolvimento da personalidade.
O perdão, como máxima expressão do amor, é indicador do auge do desenvolvimento
moral. O perdão é uma atitude madura da personalidade e deve ser vivido diariamente.
É justamente esta atitude que fará com que se diminuam os sentimentos
negativos, as atitudes de distanciamento e, ao mesmo tempo, poderá diminuir
ainda tantos conceitos ruins que criamos a partir das nossas vivências no
relacionamento a dois.
Diácono João Carlos e Maria Luiza