Quanta asneira dizem alguns falsos teólogos! Quanta arrogância e pretensão, de querer enganar o povo fiel com argumentos tendenciosos e de falsa doutrina. Basta uma formação média na doutrina para sentir o cheiro da heresia. Iniciam o seu raciocínio com a questão da vontade de Deus. Dizem estes senhores que Deus é misericordioso e quer a salvação de todos os homens. Dizendo assim, parece que a Igreja Católica, de tantos santos doutores, de um Sto Anselmo, de um São Tomás de Aquino, de tantos santos papas, não percebeu, ao longo dos seus dois mil anos, a límpida verdade. Ora, ora... descobriram a pólvora! Deus quer a salvação de todos os homens! Pois eu digo que se Jesus Cristo estivesse diante desta tal comissão, diria: "Raça de víboras"! porque não apresentam aos fiéis a doutrina completa sobre a vontade de Deus? Porque não dizem que, na sua vontade absoluta, sim, Deus só pode querer a salvação de todos os homens. Mas na sua vontade aplicada, ou seja, diante da realidade de cada um dos homens, a vontade de Deus como que respeita as circunstâncias das causas segundas, da vontade livre do homem, da situação das almas, dos atropelos da vida. A vontade de Deus só se torna eficaz com a colaboração do homem. Se assim não fosse, seríamos robôs, e não seres criados à imagem e semelhança de Deus.
Depois de falsificar assim o princípio básico do raciocínio, a quadrilha de "teólogos" parte para outra frente de combate revolucionário: a doutrina do Limbo seria apenas uma hipótese teológica. Desconhecem estes bastardos da fé o modo como a doutrina da Igreja forma a sua unidade coesa e sólida? Claro que sabem. Mas escondem e querem impor a novidade a qualquer preço, e escondem a verdade. E onde está a verdade? É dogma ou não é dogma? A verdade é que a teologia católica não é feita apenas de dogmas. Há muitas verdades anexas aos dogmas, as quais, se forem negadas, atingem em cheio o dogma a que elas se referem. Por isso elas são intocáveis, não havendo autoridade neste mundo que as possa mudar. No caso do Limbo, o dogma do pecado original e o dogma da necessidade do baptismo para a salvação. Com que autoridade podem eles sair por aí, numa revista americana, com ou sem o aval do Vaticano, dizendo que o Limbo é uma hipótese? Hipótese é Vaticano II, meus senhores! Hipótese é esta tese revolucionária, anti-católica, herética e que só serve ao senhor das Trevas. E porque razão pretendem estes modernistas evolucionistas, prestidigitadores, que os católicos deixem de dar o seu assentimento de fé ao que a Igreja sempre ensinou, com a garantia de dois mil anos de santos e santidade, para aderir a eles? E por quanto tempo, pergunto eu, deveriam os católicos "obedecer" a estas fantasias? Até que um próximo passo seja dado e um documento novo venha acrescentar que, na verdade, não é só o Limbo que não existe, mas o inferno também?
Do mesmo modo, ao afirmar que é pela misericórdia de Deus que se estabelece esta novidade, mostram o total desconhecimento dos dogmas referentes a Deus. Reduzem a misericórdia divina a um sentimento humano, onde Deus teria pena das crianças mortas sem baptismo, como se fosse possível para Deus ter sentimentos de pena e agir como um homem poderoso que agracia um criminoso que lhe pede perdão. Quanta fantasia. E dizem que são teólogos! Os autores tentam afirmar que esta doutrina não atinge o dogma do pecado original. Vamos mostrar que atinge sim.
A questão do Limbo está ligada intimamente à doutrina da necessidade do baptismo para se entrar no Céu. Isto é um dogma da nossa fé, declarado explicitamente por Nosso Senhor a Nicodemos: "Em verdade, em verdade te digo: quem não renascer da água e do Espírito Santo não entrará no Reino de Deus. O que nasceu da carne é carne e o que nasceu do Espírito é espírito." (S. Jo, 3,5). Já aqui nos deparamos com uma justificativa dos modernistas de quererem acabar com o Limbo. De facto, depois de Vaticano II, estabeleceu-se a prática de deixar o baptismo para um momento em que a pessoa possa escolher. Prática certamente diabólica, pela qual muitas almas, já contaminadas pelas tentações, tomaram o caminho do pecado e se embrenharam nas trevas do inferno. Porque, se é indiferente às crianças antes da idade da razão, morrerem com ou sem batismo, então desaparece a necessidade de baptizar-se desde o nascimento. Mas não é esta a Tradição dos Apóstolos: "A Igreja recebeu dos Apóstolos a Tradição de batizar também as criancinhas" (Orígines, Ad Rom. VI,6). E o Concílio de Trento determinará que sejam batizadas as crianças recém-nascidas "ex traditione Apostolorum" (Dec. sobre o Pecado Original, 4). Sejamos honestos: não se pode dizer que o Limbo não existe porque Deus, na sua misericórdia, leva as almas das crianças para o céu mesmo sem baptismo e, ao mesmo tempo, afirmar que esta nova doutrina não afeta o dogma do pecado original e da necessidade do baptismo.
Vários erros grosseiros são cometidos por esta super "Comissão Teológica Internacional", da Congregação para a Doutrina da Fé. Segundo as citações apresentadas pela imprensa, um dos membros "acrescentou que os muitos fatores analisados oferecem a suficiente base teológica e litúrgica para se acreditar que as crianças que morrem sem batismo se salvarão e gozarão da visão beatífica". Pelo visto estas razões teológicas são tão fracas como o argumento levantado na notícia: Para este membro da Comissão, no caso das crianças mortas antes da idade da razão, a misericórdia de Deus prevalece sobre o pecado. Oh! trevas da ignorância; Oh! astúcia do antigo inimigo! A quem querem estes senhores enganar? Pois quem foi que disse que as crianças mortas sem batismo vão para o Limbo por causa do pecado? Este senhor acaba de provar que o Limbo existe, pois se a razão da não existência do Limbo é uma suposta prevalência da misericórdia sobre o pecado, basta assinalar a doutrina católica que dá razões bem diferentes para a existência do Limbo e todo o trabalho desta comissão será posto a nu diante de todos, como mais uma armação contra a fé católica.
De facto, o que obriga a existência do Limbo é a ausência de vida sobrenatural antes do baptismo. Esta ausência deve-se à presença do pecado original, a sua marca na alma. Mas a presença do pecado original não significa que exista a culpa do pecado original, sendo esta atribuída a Adão e Eva. Não havendo a culpa, não há como se contrapor a este pecado a misericórdia de Deus. Esta só poderia ser apresentada como argumento diante de pecados pessoais, com a culpa correspondente. Mas, por definição, estes pecados actuais não existem na alma das crianças antes da idade da razão. Não há como negar, isto é dogma da nossa fé (e eles afirmam que o Limbo nada tem a ver com o dogma!). Quando um bebé nasce, possui a alma espiritual em estado natural: capacidade de conhecer, pela razão natural, e capacidade de amar, por actos livres da sua vontade. Mas ela não está apta, apenas pela sua natureza, a ter em si a presença de Deus, a graça santificante, a posse do Divino Espírito Santo. Por outras palavras: ela não é o templo da Santíssima Trindade. Deus Nosso Senhor quis que só mediante o baptismo nos fosse dada, em acréscimo, esta capacidade de vida sobrenatural (cf. S. Marcos 16, 15). Se alguém achar isto injusto, que se vá entender com Nosso Senhor lá na porta do céu. Não temos que discutir o que é Revelado por Deus, basta-nos o acto de fé; e o baptismo é o meio de obter a vida da graça, sendo, certamente, o melhor para nós, o mais fácil, o mais comum, o mais usual. As Sagradas Escrituras trouxeram-nos pelo menos um exemplo maravilhoso desta imensa bondade e misericórdia de Deus, que facilitou a entrada de tantas almas na visão beatífica: o baptismo é dado com água, e qualquer pessoa pode baptizar. Foi na estrada de Gaza, onde viajava o eunuco da Rainha da Etiópia, sentado num carro, lendo o livro de Isaías. A ele foi enviado o diácono Felipe, por obra do Espírito Santo. E ali mesmo, na beira da estrada, o pobre homem pergunta a Felipe: "Eis água, que motivo me impede de ser baptizado". (Actos, 8, 26) E Felipe baptiza-o, na beira da estrada, num açude ou riacho, e o milagre se consuma: aquela alma já não é um pagão, já não é incapaz da graça, mas tornou-se luminosa, filho de Deus, plenamente apta para a vida sobrenatural e mergulhada nela. E este milagre, os falsos teólogos querem roubar das criancinhas, atacando um dos flancos da muralha protectora da fé, que é o Limbo.
O que é o Limbo?
Diante da guerra levantada contra a doutrina católica sobre o Limbo, as pessoas sem formação tendem a pensar que este lugar é um castigo, quando na verdade não é. Trata-se de um lugar apropriado para a capacidade de uma alma humana impedida, pela presença do pecado original, de ter a vida sobrenatural. E o que acontece com esta alma, no Limbo? Ela vai agir segundo as suas capacidades naturais, e isto vai depender da idade em que tiver morrido. Se chegou a desenvolver um pouco a sua inteligência e a sua vontade, poderá receber algum conhecimento natural de Deus e dos eleitos do paraíso, que lhe trará uma felicidade natural compatível com o seu estado. É, portanto, um lugar de paz, de felicidade natural. Não é um lugar de visão beatífica, mas isso não afecta as almas dali, pois elas não têm nem sequer a noção do que seja a visão beatífica, não podendo assim desejá-la ou sentir inveja dos eleitos do Paraíso. Ao contrário, Deus pode perfeitamente alegrar estas alminhas permitindo que algum lampejo da luz do Céu venha iluminar este lugar, como fogos de artifício para que batam palmas ao Criador.
Onde querem chegar?
Vários erros modernistas, da Nova Teologia de Henri de Lubac, von Balthasar e outros exigem as mudanças que esta comissão tenta empurrar goela abaixo aos católicos. Toda a Nova Teologia e Vaticano II baseiam-se na redução da ordem sobrenatural à ordem natural. Ou seja, a graça e a glória do céu deixariam de ser acréscimos sobrenaturais dados gratuitamente por Deus, para fazerem parte da própria natureza do homem. A partir daí, é fácil introduzir outras novidades, como a salvação universal de todos os homens, já ao nascer, ou ainda o emparelhamento de todas as religiões como sendo eficazes para salvar os homens. De facto, se as crianças mortas sem batismo vão necessariamente para o céu, já não se faz necessária a fé católica, abre-se a porta para o ecumenismo radical e alucinado proposto durante mais de trinta anos por São João Paulo II. Abrem-se também as portas para canonizações de pessoas que, pelos critérios católicos, nunca alcançariam os altares.
Devemos assinalar a frase citada na imprensa: "o limbo representava um "problema pastoral urgente", pois há cada vez mais crianças que nascem de pais não católicos e que não são batizados e também "outras que não nasceram ao serem vítimas de abortos".
Não estamos em 1965, ou em 1969. Naqueles dias, os católicos engoliram a heresia progressista sem perceber e hoje já não sabem mais o que são. Diante destes factos urge ao católico armar-se com a armadura de Deus, resistindo-lhes fortes na fé, com a espada da verdade, o elmo da salvação, a alegria no coração no bom combate, na esperança da salvação, na vida eterna do céu. - Dom Lourenço Fleichman OSB