E se o feiticeiro fez um pacto com o demónio para molestar
alguém, o maligno atende-o?
Por feitiço entenda-se, aqui, a utilização de supostas forças
mágicas – por meios diversos (rituais próprios, comidas ou bebidas enfeitiçadas,
etc.) – com a intenção de prejudicar alguém. Respondamos logo que o feitiço não
se pega. Crer no seu efeito é mera superstição. Ele não tem, em si, poder
nenhum. Detalhemos!
Quem acredita na eficácia do feitiço, crê que alguém (o
feiticeiro ou mago) seja capaz de dominar a arte de produzir efeitos contrários
às leis da natureza, sobretudo para fazer o mal a algum inimigo. Ora, isto é
pura superstição, portanto, crença atrasada ou ultrapassada.
No âmbito religioso, o Pe. Leo Trese, em concordância com o
Catecismo da Igreja Católica n. 2111, afirma que “a superstição é um pecado
contra o primeiro mandamento porque atribui a pessoas ou coisas criadas poderes
que só pertencem a Deus. A honra que devia dirigir-se a Ele desvia-se para uma
das suas criaturas” (A Fé explicada. 15ª ed. São Paulo: Quadrante, 2021, p.
218). Contra este pecado grave – que se pode tornar leve dada a ignorância de
quem lhe dá crédito –, vale a advertência de São Paulo: “Estai de sobreaviso,
para que ninguém vos engane com filosofias e vãos sofismas baseados nas
tradições humanas, nos rudimentos do mundo, em vez de se apoiar em Cristo” (Cl
2,8). Dar, pois, crédito ao feitiço é, além de totalmente irracional – não há
nexo lógico entre o efeito (uma doença) e a causa (o malefício) –, pecado
contra a fé em Deus a ser amado antes e acima de tudo (cf. Ex 20,2-5; cf.
Catecismo da Igreja Católica n. 2117).
E se o feiticeiro fez um pacto com o demónio para molestar
alguém, o maligno o atende? – Dom Boaventura Kloppenburg, OFM, responde assim:
“A nossa firme resposta cristã é totalmente negativa: o homem não tem a
faculdade ou a possibilidade de provocar por sua própria iniciativa e de modo
eficiente uma atuação perceptível do diabo ou de qualquer outra entidade do
além. Esta é a razão por que sustentamos que o feitiço, o maleficio, o despacho
ou a magia negra são, como tais, ineficazes. O verdadeiro cristão não deve ter
medo do feitiço. Pois cremos na divina Providência: nem os pássaros do céu caem
na terra sem a vontade do Pai e até mesmo os cabelos todos da nossa cabeça
estão contados: ‘Não tenhais medo, pois valeis mais do que muitos pardais’ (Mt
10,31). À luz desta mensagem cristã, não podemos nem sequer pensar que o diabo,
só porque um mago ou feiticeiro o deseja ou quer, pratique ou deva executar
algum mal. O diabo só pode actuar directamente sobre os homens com a permissão
divina. O soberano domínio de Deus e a total dependência de satã reluzem com
particular ênfase nas páginas do Livro de Job: em nada pode satanás ultrapassar
os limites traçados por Deus. Mesmo para se poder apoderar dos porcos de
Gérasa, teve o diabo que suplicar a permissão do Senhor (cf. Mt 8,28-34). ‘Deus
é fiel e não permite que sejais tentados acima das vossas forças’ (1Cor 10,13)”
(A Fé do cristão católico hoje. Petrópolis: Vozes, 2001, p. 215-216). Mais
ainda: Frei Severino Gisder, OFM, à luz dos Salmos 9,16 e 7,15-17, diz: “Não
tenhas medo da maldição injustificada ou gratuita. Ela não atinge a sua meta!
Pelo contrário, não raras vezes, tal maldição recai sobre quem as proferiu”
(Anjos e demónios. A luta contra o poder das trevas. 5ª ed. São Paulo:
Artpress, 2014, p. 169).
Importa, por fim, ressaltar um dado muito importante: o
feitiço pode atingir uma pessoa, não por força própria – que não tem –, mas
pelo medo de quem se julga vítima do feiticeiro. Sim, “quanto mais alguém tem
medo de despachos, tanto mais se sugestiona no sentido de que será vítima e
tanto mais funesto será o efeito derivado. O efeito nocivo se gradua na
proporção do medo. Se, ao contrário, alguém vê um despacho, ciente de que é
dirigido contra esse alguém, mas não lhe dá a mínima importância, acredite que
nada lhe acontecerá” (Estêvão Tavares Bettencourt, OSB. Sobre o ocultismo. Rio
de Janeiro: Mater Ecclesiae, 2016, p. 95).
Em suma, o feitiço não pega. “Se Deus é por nós, quem será
contra nós?” (Rm 8,31).