“Confiança! Não temas!”
Jesus Cristo convida-nos à Confiança.
Voz de Cristo, voz misteriosa da graça que ressoais no silêncio dos corações, vós murmurais no fundo das nossas consciências palavras de doçura e de paz. Às nossas misérias presentes repetis o conselho que o Mestre dava, frequentemente, durante a sua vida mortal:
“Confiança, confiança!”
À alma culpada, oprimida sob o peso das suas faltas, Jesus dizia: “Confiança, filha, os teus pecados te são perdoados!” “Confiança”, dizia à doente abandonada que só dEle espera a cura, “a tua fé te salvou”.
Quando os apóstolos tremiam de pavor vendo-O caminhar, de noite, sobre o lago de Genesaré, Ele tranquilizava-os por esta expressão pacificadora: “Tende confiança! Sou Eu, nada temais!”
E na noite da Ceia, conhecendo os frutos infinitos do seu Sacrifício, lançava Ele, ao partir para a morte, o brado de triunfo: “Confiança! Confiança! Eu venci o mundo!…”.
Esta palavra divina, ao cair dos seus lábios adoráveis, vibrante de ternura e de piedade, operava nas almas uma transformação maravilhosa.
Um orvalho sobrenatural fecundava-lhes aridez, clarões de esperança lhes dissipavam as trevas, uma calma serenidade delas afugentava a angústia. Pois as palavras do Senhor são “espírito e vida”. “Bem aventurados os que a ouvem e a põem em prática”.
Como outrora aos seus discípulos, é a nós, agora, que Nosso Senhor convida à confiança. Por que recusar atender a sua voz?
Muitas almas têm medo de Deus
Poucos cristãos, mesmo entre os fervorosos, possuem a confiança que exclui toda ansiedade e toda a hesitação. Várias são as causas desta deficiência.
O Evangelho narra que a pesca miraculosa aterrou São Pedro. Com impetuosidade habitual, ele mediu de relance a distância infinita que separava da sua própria pequenez a grandeza do Mestre. Tremeu de terror sagrado, e prosternando-se a face contra a terra: “Afastai-vos de mim, Senhor, exclamou, que sou um pecador!”
Certas almas têm, como o Apóstolo, esse terror. Elas sentem tão vivamente a própria indigência e as próprias misérias, que mal ousam aproximar-se da Divina Santidade.
Parece-lhes que um Deus assim puro deveria sentir repulsão ao inclinar-Se para elas. Triste impressão, que lhes dá a vida interior uma atitude contrafeita, e, por vezes, a paralisa completamente.
Como se enganam essas almas!
Aproximou-Se Jesus do Apóstolo assustado: “Não temas!” disse-lhe, e o fez levantar-se…
Vós também, cristãos, que do seu amor tantas provas recebestes, nada temais! Nosso Senhor receia acima de tudo que tenhais medo dEle.
As vossas imperfeições, as vossas fraquezas, as vossas faltas mesmo graves, as vossas reincidências tão frequentes, nada O desanimará, contanto que desejeis sinceramente converter-vos. Quanto mais miseráveis sois, mais Ele tem compaixão da vossa miséria, mais deseja cumprir, junto a vós, a sua missão de Salvador…
Não foi sobretudo para os pecadores que Ele veio à terra?
A outras almas falta a fé…
A outras almas falta a fé. Elas têm certamente a fé comum, sem a qual trairiam a graça do Batismo. Crêem que Nosso Senhor é todo-poderoso, bom e fiel às suas promessas; mas não sabem aplicar a crença às suas necessidades particulares.
Não são dominadas pela convicção irresistível de que Deus, atento às suas provações, para elas Se volve para as socorrer.
Jesus Cristo pede-nos, no entanto, uma fé especial e concreta. Ele exigia-a outrora como condição indispensável dos milagres; espera-a de nós, antes de nos conceder os seus benefícios…
“Se podes crer, tudo é possível àquele que crê”, dizia ao pai do pequenino possesso. E, no convento de Paray-le-Monial, empregando quase os mesmos termos, repetia a Santa Margarida Maria: “Se puderes crer, verás o poder do meu Coração na magnificência do meu amor…”.
Podeis crer? Podereis chegar a esta certeza tão forte que nada a abala, tão clara que equivale à evidência? Isto é tudo. Quando chegardes a este grau de confiança vereis maravilhas realizaram-se em vós…
Pedi ao Mestre Divino que aumente a vossa fé. Repeti-Lhe com frequência a prece do Evangelho: “Eu creio, Senhor, mas ajudai a minha incredulidade”…
Esta desconfiança de Deus é-lhes muito prejudicial
A desconfiança, sejam quais forem as causas, traz-nos prejuízo, privando-nos de grandes bens.
Quando São Pedro, saltando da barca, se lançou ao encontro do Salvador, caminhou, a princípio, com firmeza sobre as ondas. Soprava o vento com violência. As vagas ora se levantam em turbilhões furiosos ora cavavam no mar abismos profundos…
A voragem abria-se diante do Apóstolo. Pedro tremeu… hesitou um segundo, e, logo, começou a afundar-se… “Homem de pouca fé, disse-lhe Jesus, por que duvidaste?”
Esta é a nossa história. Nos momentos de fervor, ficarmos tranquilos e recolhidos ao pé do Mestre. Vindo a tempestade, o perigo absorve a nossa atenção. Desviamos então os olhares de Nosso Senhor para os fitar ansiosamente sobre os nossos sofrimentos e perigos. Hesitamos… e afundamos logo!
Assalta-nos a tentação. O dever torna-se-nos enfadonho, a sua austeridade repugna-nos, o seu peso oprime-nos. Imaginações perturbadoras perseguem-nos. A tormenta ruge na inteligência, na sensibilidade, na carne…
E perdemos pé; caímos no pecado, caímos no desânimo, mais pernicioso do que a própria falta. Almas sem confiança, por que duvidamos?
A provação assalta-nos de mil maneiras. Ora os negócios temporais periclitam, o futuro material inquieta-nos. Ora a maldade ataca-nos a reputação.
A morte quebra os laços das afeições mais legítimas e carinhosas. Esquecemos, então, o cuidado maternal que tem para nós a Providência… Murmuramos, revoltamo-nos, aumentamos assim as dificuldades e o travo doloroso do nosso infortúnio.
Almas sem confiança, por que duvidamos?
Se nos tivéssemos apegado ao divino Mestre com uma confiança tanto maior quanto mais desesperada parecesse a situação, nenhum mal desta nos viria…
Teríamos caminhado calmamente sobre as ondas; teríamos chegado, sem tropeços, ao golfo tranquilo e seguro, e, em breve, teríamos achado a plaga hospitaleira que a luz do Céu ilumina…
Os santos lutaram com as mesmas dificuldades… muitos dentre eles cometeram as mesmas faltas. Mas estes, ao menos, não duvidaram…
Ergueram-se rápido, mais humildes após a queda, não contando, desde então, senão com o socorro do Alto…
Conservaram no coração a certeza absoluta de que, apoiados em Deus, tudo poderiam. Não foram iludidos nessa confiança!
Tornais-vos, pois, almas confiantes. Nosso Senhor a isso vos convida; e o vosso interesse assim o exige. Tornar-vos-eis, ao mesmo tempo, almas iluminadas, almas de paz.