Ano da Misericordia
Maria, Mãe e Filha da misericórdia de Deus
- 20-01-2016
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Maria, Mãe e Filha da misericórdia de Deus
A Virgem Maria e o seu ser Mãe e Filha, escrava e instrumento, da misericórdia de Deus.
No contexto deste Ano Santo da Misericórdia, neste Tempo do Advento, refletir sobre a Santíssima Virgem Maria como Mãe e Filha da misericórdia de Deus pode nos dar muitas luzes para nossa vida em Cristo Jesus. Desde o século XI, a Mãe de Deus é invocada pelos cristãos, na antiquíssima oração da Salve Regina, com a expressão em latim “Mater misericordiae”, que significa Mãe da misericórdia. Na mesma oração, a Mãe da Igreja é dirigida a invocação: “esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei”. Esta maternidade misericordiosa da Virgem Maria tem dois sentidos. Primeiramente, “ela foi a porta através da qual a misericórdia de Deus, com Jesus, entrou no mundo, e agora é a porta por meio da qual nós entramos na misericórdia de Deus, nos apresentamos diante do ‘trono da misericórdia’ que é a Trindade”. Simbolicamente, na Santa Missa de abertura do Ano da Misericórdia, que foi celebrada na Praça de São Pedro, no último dia 8 de Dezembro, “ao lado do altar estava exposto um antigo ícone da Mãe de Deus, venerada num santuário pelos grego-católicos de Jaroslav, na Polónia, conhecida como a ‘Porta da misericórdia’”. Neste contexto histórico e litúrgico riquíssimo no qual vivemos hoje, meditemos sobre a misericórdia divina na vida da Santíssima Virgem, com o ardente desejo de colher muitos frutos para a nossa vida espiritual.
A Virgem Maria: mãe e filha da misericórdia de Deus
Ser Mãe da misericórdia é apenas um dos aspectos da relação entre a Virgem Maria e a misericórdia de Deus. A Mãe de Jesus não é somente canal e mediadora da misericórdia de Deus, mas é também o objeto e a primeira destinatária da misericórdia. A Mãe de Deus “não é só aquela que nos obtém misericórdia, mas também aquela que obteve, primeiramente e mais do que todos, misericórdia. Recordemos que a palavra “misericórdia” é sinónimo de graça e que ambas dizem respeito a Deus somente em relação a nós. “Só na Trindade o amor é natureza e não é graça; é amor, mas não misericórdia. Que o Pai ame o Filho, não é graça ou concessão; é, em certo sentido, necessidade; o Pai tem necessidade de amar para existir como Pai. Que o Filho ame o Pai, não é concessão ou graça; é necessidade intrínseca, embora seja perfeitamente livre; ele precisa ser amado e amar para ser Filho”. Somente quando Deus criou o mundo e as criaturas livres que nele vivem, o seu amor se tornou gratuito e imerecido, ou seja, graça e misericórdia. Estas dizem respeito apenas a quem é inferior ou necessita da ajuda de alguém, ou alguma coisa, como nós em relação a Deus. Isso já era assim antes mesmo do pecado entrar no mundo. Por causa do pecado, conhecemos mais uma das “faces” da misericórdia de Deus, que se chama perdão. O título “cheia de graça”, atribuído a Virgem de Nazaré pelo Arcanjo são Gabriel, é sinónimo de “cheia de misericórdia”, que diz muito desta Filha da misericórdia por primazia e excelência. Maria Santíssima proclamou essa verdade da misericórdia divina no seu Magnificat: “porque olhou para sua pobre serva a sua misericórdia se estende de geração em geração, lembrado da sua misericórdia”. Em seu cântico, a Virgem Maria se sente beneficiária e, ao mesmo tempo, testemunha privilegiada da misericórdia.
Maria de Nazaré: a primeira testemunha da misericórdia
Em Nossa Senhora, “a misericórdia de Deus não se materializou como perdão dos pecados, mas como preservação do pecado. Deus fez com ela, dizia Santa Teresa do Menino Jesus, o que faria um bom médico em tempos de epidemia. Ele vai de casa em casa para curar aqueles que contraíram a infecção; mas se tem um pessoa que ele gosta especialmente, como a esposa ou a mãe, tentará, se possível, que nem sequer seja contagiada”. Dessa forma, Deus preservou Maria de Nazaré do pecado original, pelos méritos da paixão do seu Filho. A este respeito, o pensamento de Santo Agostinho sobre a humanidade de Jesus Cristo nos ajuda a refletir: “’com base no que, a humanidade de Jesus mereceu ser assumida pelo Verbo eterno do Pai na unidade da sua pessoa? Qual foi a sua boa obra que precedeu isso? O que tinha feito antes desse momento, no que tinha acreditado, ou pedido, para ser elevada a tal inefável dignidade?’. E acrescentava em outro lugar: ‘Procure o mérito, procure a justiça, reflita e veja se encontra outra coisa além de graça’”8. Estas palavras do Doutor da Graça lançam uma luz singular sobre a pessoa da Virgem Maria. Dela, devemos dizer com muito mais razão: “o que fez Maria, para merecer o privilégio de dar ao Verbo a sua humanidade? O que tinha acreditado, pedido, esperado ou sofrido, para vir ao mundo santa e imaculada? Procure também aqui, o mérito, procure a justiça, procure tudo o que quiser, e veja se encontra nela, no início, algo além de graça, ou seja, misericórdia!”9. Nesse sentido, o grande São Paulo confessa-se como fruto e troféu da misericórdia de Deus, durante toda a vida, especialmente depois da conversão.
O Apóstolo dos Gentios define-se como “alguém que alcançou misericórdia do Senhor”. Ele não se limita a formular a doutrina da misericórdia, mas torna-se sua testemunha viva: “Eu era um blasfemo, um perseguidor e um violento. Mas fui tratado com misericórdia”. Dessa forma, a Virgem Maria e o Apóstolo Paulo nos ensinam que o melhor modo de pregar a misericórdia é dar testemunho da misericórdia que Deus teve conosco. Como eles, devemos sentir-nos também frutos da misericórdia de Deus em Cristo Jesus, vivos só por ela. Nós, que livremente aceitamos o chamado de Jesus Cristo e fomos batizados, deixamos a escravidão do pecado e nos fizemos Seus escravos. Paradoxalmente, ao nos fazer escravos do Senhor Jesus, participamos da “gloriosa liberdade dos filhos de Deus”. Todavia, isso não significa que necessariamente somos todos chamados a proclamar esta verdade num apostolado da misericórdia. Nos dias de sua vida pública, Jesus Cristo curou um pobrezinho, possuído por um espírito imundo. Ao ver-se curado, ele quis segui-Lo e unir-se ao grupo dos discípulos. Entretanto, o Filho de Deus não permitiu, mas lhe disse: “Volte para a sua casa, para os seus, anuncie-lhes o que o Senhor te fez e a misericórdia que teve contigo”. Dessa forma, compreendemos que, a exemplo da Virgem Maria, cada um de nós somos filhos da misericórdia e, por isso, devemos testemunhar pela vida, por palavras, pelas obras, o misericordiosíssimo amor de Deus.